Registrar o que acontece em cada sessão terapêutica é uma das tarefas mais importantes no trabalho com indivíduos com autismo e outros transtornos do neurodesenvolvimento. Mas nem todo registro é um dado.
Muitas vezes, o profissional escreve percepções ou impressões pessoais que, embora relevantes, não podem ser analisadas de forma objetiva. É aí que surge a diferença entre registros subjetivos e dados mensuráveis — e compreender essa distinção é essencial para garantir intervenções eficazes e baseadas em evidências.
Como já afirmava B. F. Skinner (1968, p. 25), “o que o aluno aprende depende do que ele faz, não do que o professor faz”. O mesmo vale para a prática terapêutica: só é possível compreender o comportamento se observamos e registramos o que o indivíduo faz, em vez de como acreditamos que ele se sentiu.
O que são registros subjetivos?
Os registros subjetivos refletem a percepção do terapeuta sobre o comportamento ou o estado emocional da pessoa atendida.
Exemplos comuns: • “Ele pareceu mais calmo hoje.” • “A sessão foi produtiva.” • “Estava feliz durante a atividade.”
Essas anotações ajudam a compor um retrato qualitativo da sessão, revelando o olhar clínico e empático do profissional. No entanto, elas não são suficientes para medir progresso, justamente porque dependem da interpretação individual de quem observa. Como destaca Baer, Wolf e Risley (1968, p. 93), um dos pilares da ABA é que “os procedimentos e os resultados devem ser descritos de forma que qualquer observador independente possa identificar as mesmas respostas e as mesmas mudanças”. Ou seja, subjetividade tem valor complementar, mas não deve ser confundida com evidência comportamental.
O que são dados mensuráveis?
Os dados mensuráveis descrevem comportamentos observáveis e quantificáveis, ou seja, informações que qualquer pessoa treinada poderia verificar da mesma forma.
Exemplos: • “Durante a sessão, permaneceu sentado por 8 minutos consecutivos.” • “Respondeu corretamente a 5 das 6 instruções dadas.” • “Emitiu 3 tentativas espontâneas de comunicação verbal.”
Esses registros permitem comparar desempenhos ao longo do tempo, analisar padrões e tomar decisões baseadas em dados. Skinner (1953, p. 35) já defendia que “a ciência do comportamento se apoia na observação direta dos fatos e na mensuração precisa das mudanças de resposta”. Sem essa mensuração, o progresso terapêutico se torna uma questão de opinião — e não de ciência.
Por que essa diferença importa?
A distinção entre percepção e dado é o que separa opinião de evidência. Na prática clínica, é comum que as duas formas de registro coexistam — e isso é saudável. O importante é não confundir relato subjetivo com dado terapêutico.
🔹 Registros subjetivos mostram como o terapeuta percebe o comportamento.
🔹 Dados mensuráveis mostram o que realmente aconteceu e com que frequência.
Segundo Cooper, Heron e Heward (2020, p. 101), “a observação e mensuração do comportamento são o coração da análise aplicada; elas permitem verificar a relação entre o que o terapeuta faz e o que o cliente aprende”. Somente com base nesses dados é possível verificar se um programa de ensino está funcionando, se há generalização de habilidades ou se é necessário ajustar as estratégias.
Como equilibrar os dois tipos de registro?
- Descreva o comportamento, não o rótulo. Em vez de “estava irritado”, prefira “bateu palmas com força e gritou durante 30 segundos”.
- Use escalas ou contagens. Quantifique sempre que possível — tempo, frequência, número de respostas corretas, etc.
- Registre o contexto. Indique antecedente e consequência para facilitar a análise funcional.
- Adicione percepções breves, mas não como base do relatório. As impressões são complementares, não substitutas dos dados.
Na ABA, registrar é intervir melhor — e registrar com qualidade é transformar informação em conhecimento.
A subjetividade é bem-vinda quando vem acompanhada de observação precisa. Assim, o terapeuta une ciência e sensibilidade, garantindo que cada decisão terapêutica tenha um propósito, uma evidência e um resultado mensurável.
Como resumiu Skinner (1974, p. 19), “a análise científica do comportamento não elimina a humanidade; ela a revela com maior clareza e precisão”.
Referências
BAER, Donald M.; WOLF, Montrose M.; RISLEY, Todd R. Some Current Dimensions of Applied Behavior Analysis.
Journal of Applied Behavior Analysis, v. 1, n. 1, p. 91–97, 1968. DOI: 10.1901/jaba.1968.1-91. COOPER, John O.; HERON, Timothy E.; HEWARD, William L.
Applied Behavior Analysis. 3. ed. New Jersey: Pearson Education, 2020.


























