22 de maio de 2023

A Ciência do abraço

Abraçar traz benefícios físicos emocionais, mentais e sociais. De acordo com Kim Bielak  o toque físico é crucial para os seres humanos. “Abraçar é uma maneira de estarmos biologicamente conectados.”

Para a autora, Virgínia Satir, psicoterapeuta americana, “abraçar também libera o hormônio oxitocina, que às vezes é chamado de “hormônio do abraço” ou “hormônio do amor” porque nosso corpo o produz quando estamos próximos fisicamente de outras pessoas. Quando a oxitocina é produzida, ela alivia a sensação de estresse, pois limita a produção do hormônio do estresse norepinefrina e nos acalma.

Um abraço pode regular as emoções, as pesquisas mostram que o toque é a chave para desenvolver a capacidade de acalmar. Abraços de uma pessoa segura podem ajudar a administrar as emoções. Abraçar aumenta a produção de oxitocina, diminui o estresse e o medo.

A falta de abraços pode causar solidão, depressão, estresse, dor física e piorar a qualidade do sono, ao passo que abraçar traz vantagens como: aumento da imunidade, melhora da saúde cardiovascular, aumento do bem-estar geral, melhora do sono.

Assim, embasados por algo além de uma narrativa, convidamos os leitores para passear pelo depoimento de Oliver Sacks sobre a figura autista de Temple Grandin, profissional admirada e respeitada em todo mundo. Oliver Sacks publicou “Um antropólogo em Marte” em 1995. Minayo (1996)  observa que o autor “termina sua obra com a história de Temple Grandin, a autista que lhe forneceu o título de seu trabalho. Professora da Colorado State University, gerente de seus próprios negócios, pesquisadora e conferencista de renome, ela surpreende pela capacidade reflexiva sobre a problemática do autismo, mas sobretudo pela inteligência prática, pelo talento técnico, pelo forte poder de introspecção e relato. Mas seu poder essencial está na profunda sensibilidade para com o mundo animal e para a essencialidade do afeto e da compreensão dos sentimentos do gado bovino e suíno. Temple surpreendeu a todos, numa recente palestra quando disse: “se pudesse estalar os dedos e deixar de ser autista, não o faria — porque então eu não seria mais eu. O autismo é parte do que sou”.

Transcrição de parte do texto de Oliver Sacks

Um antropólogo em Marte

“Finalmente, sem acanhamento ou embaraço (emoções desconhecidas para ela), Temple me mostrou seu quarto, autero, com paredes brancas e nuas, uma cama de solteiro e ao lado dela um objeto muito grande com um aspecto estranho. “O que é isso?”, perguntei. “É a minha máquina de espremer”, Temple respondeu. “Tem gente que a chama de minha máquina do abraço.”

O mecanismo tinha dois lados de madeira pesados e inclinados, talvez com um metro e meio por um metro cada, prazerosamente estofados com um enchimento espesso e macio. Eram ligados por dobradiças e uma prancha de base longa e estreita, criando uma calha do tamanho deum corpo e em forma de V. Havia uma complexa caixa de controle numa das extremidades, com tubos muito resistentes levando a outro mecanismo, dentro do armário. Temple o mostrou também. “É um compressor industrial”, disse, “do tipo que usam para encher pneus.”

“E para que serve?”

“Proporciona uma pressão firme, porém confortável sobre o corpo, dos ombros aos joelhos”, disse Temple. “Tanto uma pressão regular como variável ou pulsante, como você desejar”, acrescentou. “Você arrasta-se para dentro dele – vou mostrar-lhe -, liga o compressor, e fica com todos os controles na mão, aqui, bem na sua frente.”

Quando lhe perguntei por que alguém deveria querer se submeter a tal pressão, ela me contou. Quando era uma menininha, disse, desejava muito ser abraçada, mas ao mesmo tempo ficava aterrorizada com qualquer contato. Quando era abraçada, especialmente por uma tia predileta (e gorda), sentia-se esmagada, subjugada pela sensação; tinha u sentimento de prazer e paz, mas também de terror e de ser afundada. Começou a devanear- tinha apenas cinco anos na época – sobre uma máquina mágica que pudesse espremê-la com força, porém gentilmente, numa espécie de abraço, de uma maneira inteiramente controlada por ela. Anos mais tarde, quando adolescente, viu a foto de uma calha afunilada desenhada para impedir a passagem ou conter o gado e concluiu que era aquilo: uma pequena modificação para adaptá-la ao uso humano, e podia ser sua máquina mágica. Pensou em outros mecanismos – roupas infláveis, que pudessem exercer uma pressão uniforme em todo o corpo – massa calha afunilada, em sua simplicidade, era completamente irresistível.

Sendo de um feitio mental prático, Temple logo tornou sua fantasia realidade. Os primeiros modelos ainda eram grosseiros, com algumas pontas e pequenos defeitos, mas acabou chegando a um sistema totalmente confortável e previsível, capaz de dispensar um “abraço” com os parâmetros que ela bem desejasse. Sua máquina de espremer funcionou exatamente como esperava, produzindo aquela sensação de tranquilidade e prazer com que sonhava desde a infância. Não teria sobrevivido aos seus dias mais tumultuados na universidade sem sua máquina, ela disse. Não podia se voltar para os seres humanos em busca de consolo e conforto, mas podia sempre recorrer à máquina.

Esta, que ela nem exibia nem escondia, mantendo-a abertamente em seu quarto na universidade, provocou escárnio e suspeitas e era vista por psiquiatras como uma “regressão” ou “fixação” –  algo que precisava ser psicanalisado e resolvido. Com sua teimosia característica, sua tenacidade, sua coerência consigo mesma e sua bravura – acompanhadas por uma completa falta de inibição ou hesitação – Temple ignorou todos esses comentários e reações e decidiu encontrar uma “validação” científica para seus sentimentos.

Tanto antes como depois de escrever sua tese de doutorado, empreendeu uma investigação sistemática sobre os efeitos de uma pressão profunda em autistas, estudantes universitários e animais, e recentemente publicou um artigo sobre o assunto no Journal of Child ad Adolescent Psychopharmacology. Hoje, sua máquina de espremer, com diversas modificações, está passando por extensivas análises clínicas. Ela também se tornou a principal projetista do mundo de calhas afuniladas para gado e publicou em revistas de veterinária e da indústria de carnes, vários artigos sobre a teoria e a prática do comedimento humano e da contenção moderada.

Enquanto me flava isso, Temple ajoelhou-se, deitou de bruços no meio do V, ligou o compressor (que levou um minuto para encher o cilindro principal) e girou os controles. Os dois lados convergiam, apertando-a com firmeza, e depois, quando ela fez um pequeno ajuste, aliviaram ligeiramente a pressão. Foi a coisa mais estranha que já vi e contudo, com toda a esquisitice, era tocante e simples. Certamente não havia dúvidas sobre o seu efeito. A voz de Temple, em geral alta e dura, tornou-se mais suave e amena enquanto estava deitada em sua máquina. “Eu tento torná-la o mais suave possível”, ela disse, falando em seguida sobre a necessidade de “se entregar totalmente… Agora estou realmente relaxada”, acrescentou tranquilamente. “Imagino que as pessoas cheguem a isso por intermédio de relações com os outros.” (SACKS, 1995).

 

Referências:

PSYCHCENTRAL, 2023. Disponível em: https://psychcentral.com/blog/the-healing-power-of-hugs Acesso em: 02 mai 2023.

SACKS, Oliver. Um Antropólogo em Marte. São Paulo: Companhia das letras, 1995.

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Sobre o(a) autor(a)
Sandra Paro

Sandra Paro

Sandra Paro é mãe, professora, estudiosa, idealizadora da ABA+, analista do comportamento, consultora de recursos terapêuticos, corajosa, disciplinada e ensaísta para o ABA+
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